Maracanã: 75 anos de glórias e cicatrizes de concreto

Leo Pinheiro

O Estádio Jornalista Mário Filho, o Maracanã, completa 75 anos neste 16 de junho de 2025 carregando no concreto e na memória do povo brasileiro um patrimônio de glórias, derrotas, transformações e resistência. Erguido para a Copa do Mundo de 1950, o “Maior do Mundo” se tornou não apenas um templo do futebol, mas um símbolo da alma popular carioca: vibrante, sofrida e apaixonada.

Ao longo de sua história, o Maracanã viveu momentos imortais: o milésimo gol de Pelé, a consagração de Zico — maior artilheiro do estádio, com nada menos do que 334 gols — os dribles de Garrincha, as vitórias épicas de Flamengo, Fluminense, Vasco e Botafogo, as finais da Libertadores, os Fla-Flus históricos, a emoção das torcidas misturadas em um só grito. Mas também presenciou derrotas amargas, como o “Maracanazo” de 1950 ou o drama silencioso da final do Brasileirão de 1992, quando parte das arquibancadas cedeu, vitimando seus amantes mais fieis, os torcedores do Flamengo, que, domingo após domingo, mantinham o estádio vivo com sua fé no futebol.

Por trás das emoções, o Maracanã também conta outra história: a das reformas que custaram mais do que deveriam, deixando marcas nem sempre visíveis, mas dolorosas. A primeira grande reforma, no fim dos anos 1990, visava preparar o estádio para o Mundial de Clubes de 2000. Com orçamento inicial de R$ 50 milhões, a obra ultrapassou o dobro do valor previsto. Foi ali que as antigas arquibancadas de concreto e as cadeiras de ferro começaram a ceder lugar ao “padrão FIFA”, com assentos de plástico mais modernos, e menos autênticos.

A segunda reforma, em 2007, antecedendo os Jogos Pan-Americanos, rebaixou o gramado, extinguiu a histórica Geral, o setor mais democrático e popular do estádio, e consumiu seis vezes o orçamento original: cerca de R$ 300 milhões, suficiente para construir um novo estádio à época.

A terceira e mais controversa reforma foi para a Copa do Mundo de 2014. O projeto, sob o pretexto de modernização, derrubou até as marquises tombadas pelo patrimônio histórico, em clara manobra para contornar a legislação. O estádio ganhou camarotes e áreas VIP, e os setores populares perderam ainda mais espaço — após a extinção dos geraldinos, poucos anos antes, chegara a hora dos arquibaldos serem expulsos daquela que outrora fora sua casa. O custo final da obra nunca foi oficialmente revelado, mas sabe-se que ultrapassou muito a marca de R$ 1 bilhão — valor, então, suficiente para construir dois estádios modernos do zero.

Apesar da elitização, do concreto maquiado, e das cadeiras que substituíram os gritos de pé da Geral, o Maracanã continua sendo do povo. Porque enquanto houver uma criança nas arquibancadas — ou nas atuais cadeiras — olhando para o gramado e sonhando em fazer um gol nas traves sagradas, o Maracanã estará vivo. Enquanto houver um trabalhador que economiza no almoço, e anda quilômetros a pé para guardar o dinheiro da passagem da semana para comprar um ingresso para ver seu time no domingo, o espírito do Maraca resistirá.

Setenta e cinco anos depois de sua inauguração, o Maracanã não é mais o mesmo. Mas ninguém é. Ele continua maior do que as cifras que o cercam, mais forte que as tragédias que o marcaram, e mais popular que os camarotes que tentam sufocar sua alma. Porque o Maracanã, no fim das contas, é feito de concreto, mas também de lágrimas, gritos, sonhos e gente. Gente desse Brasil que cante e é feliz, que ainda acredita no futebol como esperança, e no estádio como altar.

Leo Pinheiro é jornalista, e dedica este artigo a João Baptista Vieira, Delegado da Federação Metropolitana de Futebol (atual FERJ), e seu avô materno.