As Ilusões das Privatizações

Não existe panaceia: difícil mesmo é a vida dos brasileiros

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Reinaldo Fujimoto

Na mitologia grega, Panaceia é a deusa da cura. Esta deusa era filha de Asclépio, deus da medicina, que ensinou os segredos do seu ofício para Panaceia e, assim, a deusa teria o poder de curar todas as enfermidades.

O artigo “A vida difícil do Banco do Brasil”, publicado aqui, na edição de 19/08/2020, repete um padrão de argumentos sobre a privatização no Brasil: vender empresas públicas é apresentado como a grande solução do País. Como na mitologia, teríamos uma medida capaz de curar o País de todos os vícios políticos e resolver, ao mesmo tempo, os gargalos da economia brasileira e os problemas do Estado brasileiro.

Oferecer soluções simplistas tem grande poder de sedução e iludem a muitos. Assim como o País insiste em salvadores da pátria – na política – na ótica econômica o viés da privatização carrega a promessa de que a economia brasileira iria para o nirvana.

Ficando tão somente no caso do sistema financeiro, a complexidade da concentração bancária no País e o necessário estímulo à concorrência deveriam inibir arroubos sobre o esvaziamento dos bancos públicos.

Ao dimensionar o papel do Banco do Brasil neste momento difícil da vida dos brasileiros sabemos o quanto esta empresa pública poderia atuar vigorosamente em programas de crédito assegurando fôlego para atividades produtivas nesta conjuntura tão adversa. Porque difícil mesmo é a vida dos brasileiros.

Outro ponto não abordado com devida clareza pelo articulista, foi a curta trajetória no cargo do ex-presidente do Banco do Brasil, recentemente demissionário. Não se trata de uma “vítima de Brasília”, ao contrário, com as credenciais de“ homem de mercado”, foi um dirigente que semeou frequentes discórdias com os poderes constituídos, criou dificuldades institucionais e arranhou a reputação do BB.

A inobservância da liturgia do cargo colocou o Banco do Brasil como protagonista de episódios desgastantes, inclusive junto aos órgãos de controle.

Tais posturas foram objeto de ações da Associação Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil nos fóruns adequados como a Comissão de Valores Mobiliários, Tribunal de Contas da União e o próprio Conselho de Administração do Banco do Brasil.

O articulista parece imbuído de convencer a todos, inclusive os “bons funcionários” do BB, sobre os benefícios da privatização insinuando que maus são os sindicatos e associações, demonstrando lamentável traço autoritário.

É importante afirmar que os funcionários do Banco do Brasil trabalham em um banco que atua no mercado há décadas, proporciona resultados sólidos e dividendos para os acionistas, ganha prêmios internacionais de sustentabilidade, tem papéis negociados no mercado de Nova Iorque e é reconhecido pela governança de acordo com órgãos reguladores. Esta dimensão de empresa pública que busca a eficiência, a competitividade e a entrega de resultados aos acionistas tem sido fruto do trabalho dedicado e comprometido dos funcionários do BB.

Contar com um banco público – que tem quase 70 milhões de clientes – para agir neste momento sob a perspectiva de medidas anticíclicas é indispensável para uma economia abalada pelo fechamento de empresas, sobretudo micro e pequenas, sem falar no desaparecimento de vagas de postos de trabalho e nas dificuldades enfrentadas pelos microempreendedores individuais.

Não se trata de lançar o Banco do Brasil em aventuras ou projetos sem sustentabilidade no longo prazo. Mas basta ver milhares de brasileiros nas longas filas da Caixa Econômica Federal, causando aglomerações desaconselhadas pelas autoridades de saúde, para percebermos um sinal claro de atrofia do Banco do Brasil nestes tempos difíceis.

A visão rudimentar de que o “mercado resolve tudo e é o melhor em tudo”, não tem sido vitoriosa na experiência internacional recente. A ação de governantes, de diferentes colorações políticas, no mundo inteiro, tem se pautado por estímulos do Estado para enfrentar uma das mais sérias crises econômicas do mundo.

A estagnação brasileira e a grave crise social decorrente serão perpetuadas sem uso adequado de instrumentos públicos. Com responsabilidade e levando em conta a capacidade de atuar em sua dupla dimensão – mercadológica e social – o Banco do Brasil está preparado para fazer mais e contribuir para a vida de todos os brasileiros.
Reinaldo Fujimoto/ Presidente da ANABB

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